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A impenetrável caixa de papelão

Após um dia cansativo, Augusto se encontrava no fundo da sala de aula lutando bravamente para não baixar a cabeça na mesa, pois, se o fizesse, dormiria. Trabalhar de dia e estudar à noite é uma vida difícil.  Resolveu concentrar toda a sua atenção em alguns colegas que tentavam dissuadir a professora de lhes cobrar a apresentação do trabalho hoje. Ele estava nervoso, pois teve pouco tempo para fazer uma maquete. Não sabia se estava boa o suficiente. Além disso, sempre sentia calafrios só de imaginar ter de falar à frente de todos. Apavorado, observou seus colegas voltarem às suas mesas contrariados. Um deles ainda quis protestar, mas a professora se manteve firme: “Pessoal, vocês estão no primeiro ano do ensino médio. Já passou da hora de terem mais responsabilidade.” E para piorar, após consultar uma lista, a professora olha diretamente para Augusto e ordena: “Augusto, venha apresentar o trabalho!”

Ao ouvir isso, Augusto sentiu um paralisante arrepio. Pensou na possibilidade de não ir adiante, mas a professora o olhava impacientemente. Mais uma vez lamentou a primeira letra de seu nome. Levantou-se com dificuldade. A cadeira ainda tentou abraçá-lo e implorou pra que ele não fosse, mas o olhar da professora era mais convincente. Pegou a maquete que estava envolta em uma caixa de papelão e caminhou para a frente quase se escondendo nela. Sentiu nos ossos os olhares de todos os seus colegas cujos nomes mal sabia, pois uma vergonha indescritível o possuía sempre que tentavam conversar com ele. Ao chegar na frente de todos, olhou por cima da cabeça de cada um deles. “Pode começar!” – disse a professora. Augusto estava muito nervoso, suas mãos suavam e ele começou a tremer. Ainda estava sem coragem de revelar a maquete. Quando abriu a boca pra falar, foi interrompido pela risada do garoto à sua frente. E mais uma garota riu. E mais outra. Logo, todos na sala estavam apontando para ele e rindo, até mesmo a professora. Então ele compreendeu. E sentiu o coração acelerar. Começou a sentir tontura e falta de ar, pois antes que pudesse olhar para baixo, descobriu que estava completamente nu. Tentou se esconder atrás da caixa, tentou até mesmo ENTRAR na caixa, mas sentiu a alma congelar e caiu para trás ao som dos risos. E começou a girar e a girar e a girar…

É muito comum confundirem a ansiedade social com excesso de timidez. Uma pessoa tímida apenas tem um leve receio de ser rejeitada, mas com poucos sintomas, ou apenas passageiros. Já uma pessoa que sofre de fobia social possui um medo extremo, não apenas de ser rejeitado, mas de vivenciar situações altamente vexatórias diante de um grupo de pessoas. É por isso que ele costuma construir uma personalidade perfeccionista, criando padrões e estilos elevadíssimos muito difíceis de acompanhar. Dessa forma, ele acredita que estará protegido de julgamentos críticos destrutivos, os quais ele tanto teme. Além disso, o sociofóbico sente na pele, e no corpo, sintomas que vão desde a sudorese até a aceleração cardíaca.

Em seu escasso círculo social, é comum rotular esse paciente como egocêntrico e arrogante, pois não entendem que, na verdade, estão diante de uma pessoa com problemas emocionais.

Pessoas com esse tipo de transtorno tem dificuldade em socializar. Tanto no trabalho quanto na escola, a pessoa prefere ficar sozinha. Por isso há sempre um desconforto imenso ao tentar fazer novas amizades, participar de uma entrevista de emprego ou iniciar um namoro. Entretanto, ele consegue se encaixar bem em situações formais de trabalho onde a intimidade é dispensável e inapropriada, pois se aproveita disso para evitar a exposição e se manter seguro. Mas ao tentar permanecer dentro dessa bolha o máximo de tempo possível, o paciente se afunda cada vez mais no isolamento social e tem cada vez menos força para tentar reverter esse quadro.

Mas com acompanhamento e uma boa dose de coragem, é possível não apenas conviver bem com o transtorno, mas subjugá-lo de modo que ele se torne quase imperceptível ou até mesmo desapareça de vez:

– saia da zona de conforto! Sim, é possível que você fique bem após se aproximar de alguém para conversar. Faça um esforço!

– se você receber um convite para sair com amigos, VÁ! Sim, você poderá sentir medo, preguiça e até mesmo um pouco de mal-estar, mas confirme presença e depois junte todas as suas forças para ir. Você passará por bons momentos sem se dar conta do bem enorme que estará fazendo para si mesmo.

– não tenha medo de falar ao telefone. Elogie quem estiver do outro lado da linha! Expresse uma opinião pessoal! Aproveite esse momento para treinar a sua comunicação com outra pessoa.

– quando conversar pessoalmente com alguém, SEMPRE olhe nos OLHOS dessa pessoa.

– se houver alguma situação de pânico ou algum sintoma corporal fora do comum, como taquicardia, tremedeira, entre outros, procure um psiquiatra!

“AUGUSTO!”

Augusto balbuciava enquanto se abraçava à sua mesa no fundo da sala. Ouviu mais uma vez um forte chamado da professora: “AUGUSTO!” – ele levanta a cabeça. Estava babando, então limpa a boca rapidamente. A professora lhe pergunta: “Você está bem?” – lentamente Augusto se dá conta de que dormiu e teve um pesadelo sobre hoje ser o dia da apresentação do trabalho. Sequer havia feito uma maquete. Não havia ninguém fazendo apresentações e ele estava totalmente vestido. Suspirou, completamente aliviado, e fez que “sim” com a cabeça para a professora. Ela respondeu: “Ótimo! Então vá apresentar o trabalho!”